Descrição
Abstract. This study evaluated the effects of acidification and freezing on the stability of urinary nitrogenous compounds. Urine samples from three lactating dairy cows were used, with three types of dilution (distilled water without acid, 0.072 N sulfuric acid solution, and 0.82 N sulfuric acid solution). Samples were analyzed for urea and creatinine on days 0, 1, 7, 15, and 30 of storage at –20°C. Statistical analyses were performed using SAS MIXED, considering the fixed effects of acidification, storage time, and their interactions, with multiple comparisons assessed by Tukey’s test. Creatinine was significantly affected by the interaction (p < 0.01), showing a sharp decline on day 7 and higher values at day 30 in the weak acid and non-acidified treatments. Urea concentrations were influenced by storage time and the interaction (p = 0.01), with a marked decline on day 7 followed by recovery at day 30, with the highest concentrations observed in the weak acid treatment.
Keywords: acidification, nitrogenous compounds, purine derivatives.
Resumo. Este estudo avaliou os efeitos da acidificação e do congelamento sobre a estabilidade desses compostos. Foram utilizadas urina de três vacas leiteiras, com três tipos de diluição (água destilada sem adição de ácido, solução 0,072 N de ácido sulfúrico, e solução 0,82 N de ácido sulfúrico). As amostras foram analisadas para ureia e creatinina nos dias 0, 1, 7,15 e 30 dias de congelamento a -20°C. As análises estatísticas foram realizadas no SAS MIXED, com efeitos fixos de acidificação, tempo e interações pelo teste de Tukey. A creatinina foi afetada pela interação (p <0,01), com queda no dia 7 e maiores valores aos 30 dias no ácido fraco e sem ácido. A ureia variou com tempo e interação (p=0,01), com queda no dia 7 e recuperação no dia 30, sendo maior no ácido fraco.
Palavras-chave: acidificação, compostos nitrogenados, derivados de purinas.
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Introdução
A urina é uma amostra biológica importante utilizada na avaliação do metabolismo proteico de ruminantes, pois reflete a excreção de nitrogênio (N), na forma de ureia. Esses indicadores estão diretamente associados à eficiência do uso de nitrogênio (EUN) e ao impacto ambiental dos sistemas de produção. Em vacas leiteiras, cerca de 70% do N ingerido é excretado nas fezes e urina, proporção substancialmente maior do que a fração secretada no leite (21–33%; Calsamiglia et al., 2010). A ureia na urina é particularmente preocupante por sua rápida hidrólise em amônia (NH₃), que pode volatilizar ou ser convertida em nitrato e posteriormente em óxido nitroso, um potente gás de efeito estufa (Eckard et al., 2010).
Do ponto de vista nutricional, o excesso de N na urina decorre do desbalanço entre proteína e energia fermentável, levando à absorção de NH₃ no rúmen, conversão em ureia no fígado e subsequente excreção renal. Diante desse cenário, estratégias para aumentar a EUN, como a redução da proteína bruta (PB) na dieta têm recebido destaque na literatura (Olmos Colmenero e Broderick, 2006; Danes et al., 2013).
Apesar de consolidada como ferramenta metabólica, a análise de urina ainda carece de protocolos padronizados de conservação. O armazenamento e o uso de acidificação são práticas comuns, mas não há consenso sobre sua influência na estabilidade de compostos nitrogenados, como ureia e creatinina.
Diante disso, o objetivo deste estudo foi avaliar os efeitos da acidificação e do tempo de congelamento sobre a estabilidade de compostos nitrogenados presentes na urina e nossa hipótese foi que a acidificação altera as concentrações desses compostos na urina e que esse efeito é diferente de acordo com o tempo de congelamento das amostras. -
Referencial teórico
O estudo da excreção urinária de compostos nitrogenados em ruminantes ganhou relevância a partir da necessidade de compreender melhor a utilização da proteína dietética e a eficiência do metabolismo de N. Os primeiros trabalhos buscam caracterizar a composição de urina e a viabilidade de sua utilização como matriz biológica para estimar a síntese de proteína microbiana no rúmen, com base na excreção de derivados de purinas. Nesse contexto, consolidou-se a coleta total de urina como o método de referência para quantificação absoluta da excreção diária de metabólitos (Fleming et al., 1991; Valadares et al., 1997), permitindo avaliar com rigor a EUN e fechar o balanço nitrogenado em experimentos com vacas leiteiras.
A estabilidade dos compostos nitrogenados na urina, entretanto, depende diretamente de suas propriedades químicas e da interação destas com o ambiente de armazenamento. A literatura demostra diferenças marcantes na solubilidade e no comportamento estrutural de metabólitos como creatinina e ureia, fatores que tornam alguns compostos mais ou menos suscetíveis à degradação durante o processamento e a estocagem das amostras (Oliveira et al., 2001; Silva et al., 2001; Rennó et al., 2003).
Apesar de ser considerado o padrão ouro, o método de coleta total de urina apresenta limitações práticas e de manejo em experimentos com ruminantes, como a necessidade de adaptação dos animais a bolsa ou coletores, o elevado estresse durante a coleta e a dificuldade em manter a estabilidade dos metabolitos ao longo de 24 horas. Por essas razões, metodologias alternativas foram propostas, com destaque para o uso da creatinina como indicador endógeno na urina.
A creatinina é excretada em taxa relativamente constante, proporcional à massa muscular, o que permite sua utilização para estimar o volume urinário diário a partir de amostras spot. Esse avanço possibilitou a redução do manejo intensivo de coleta e ampliou a viabilidade de experimentos de campo (Chizzotti et al., 2008). No entanto, a confiabilidade do método depende da correta estabilização das amostras no momento da coleta, a fim de evitar degradação ou precipitação dos compostos nitrogenados.
A conservação da urina, por sua vez, constitui ponto crítico na precisão das análises. A acidificação com ácido sulfúrico é o procedimento mais comum, pois mantém o pH em níveis que inibem a ação de microrganismos e previnem perdas de N por volatilização de NH₃ (Valadares et al., 1999). A concentração de ácido utilizada, entretanto, varia entre protocolos, apresentando impactos distintos sobre a estabilidade de ureia e creatinina.
Além da acidificação, o tempo e as condições de armazenamento influenciam diretamente a integridade das amostras. Estudos relatam que períodos prolongados de armazenamento, mesmo sob congelamento, podem afetar a recuperação de alguns metabolitos, especialmente em amostras mal acidificadas ou expostas a variações de temperatura (Oliveira et al., 2001; Rennó et al., 2003). Nesse contexto, compreender as interações entre tipo de ácido, concentração utilizada e tempo de congelamento é essencial para garantir que as análises reflitam com fidelidade o metabolismo nitrogenado dos animais. Contudo, a falta de padronização de protocolos de conservação, incluindo acidificação e congelamento, torna evidente a necessidade de uma investigação sistemática que avalie a magnitude das perdas e os impactos desses fatores sobre a confiabilidade das estimativas do metabolismo proteico em ruminantes. -
Material e métodos
O experimento foi conduzido no Laboratório de Pesquisa Animal do Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Lavras, utilizando uma amostra composta de urina coletada de 3 vacas leiteiras alojadas em sistema Free Stall. Foram avaliados três tipos de diluição das amostras (todas na proporção 1:4 vol:vol): água destilada sem adição de ácido, solução 0,072 N de ácido sulfúrico, e solução 0,82 N de ácido sulfúrico. As amostras foram analisadas para concentração de ureia e creatinina no momento da coleta (dia 0), e após 1, 7 e 15 e 30 dias de congelamento a -20ºC.
As análises estatísticas foram realizadas utilizando o procedimento MIXED do SAS University Edition, considerando como efeitos fixos de acidificação, tempo de congelamento e suas interações. Comparações múltiplas foram feitas pelo teste de Tukey, os efeitos foram considerados significativos quando P < 0,05. -
Resultados
A creatinina foi afetada (tabela 1) pela interação entre tempo de armazenamento e acidificação (p <0,01), com redução acentuada no dia 7 em todos os tratamentos e maiores valores aos 30 dias no ácido fraco (9,05b mg/dL) e sem ácido (8,62b mg/dL). Para a ureia observou-se efeito do tempo (p <0,01) e da interação tempo x ácido (p=0,01), com queda acentuada no dia 7 e recuperação posterior no dia 30, o ácido fraco apresentou maior concentração (147,52a mg/dL), seguido pelo sem ácido (134,49b mg/dL), enquanto o ácido forte resultou em menores valores (98,53c mg/dL).
Tabela 1 – Resultados análise de creatinina e ureia.
Creatinina P valores
Acido 0 dias 1 dia 7 dias 15 dias 30 dias EPM Tempo Acido Tempoxacido
Forte 8,15 ab 12,68 b 3,76 a 4,61 a 5,80 a 0,93 0,01 <0,01 <0,01
Fraco 6,51 ab 6,63 a 2,17 a 4,30 a 9,05 b 0,93 0,01 <0,01 <0,01
Sem 7,65 ab 4,14 a 2,99 a 2,68 a 8,62 b 0,93 0,01 <0,01 <0,01
Ureia P valores
Acido 0 dias 1 dia 7 dias 15 dias 30 dias EPM Tempo Acido Tempoxacido
Forte 105.49 b 93.42 ab 54.41 a 80.57 ab 98.53 c 8,01 <0,01 0,2 0,01
Fraco 119.92 a 77.16 b 50.81 a 78.42 b 147.52 a 8,01 <0,01 0,2 0,01
Sem 106.65 b 88.66 a 53.31 a 87.36 a 134.49 b 8,01 <0,01 0,2 0,01 -
Conclusão
Conclui-se que a interação entre tempo de armazenamento e acidificação influenciou significativamente a estabilidade dos compostos nitrogenados na urina, evidenciando a necessidade de considerar ambos os fatores de forma conjunta para garantir a confiabilidade das análises.
Agradecimentos
Os autores agradecem o apoio financeiro da agência CAPES.
6. Referências
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Valadares, R.F.D.; Gonçalves, L.C.; Rodriguez, N.M. et al. Níveis de proteína em dietas de bovino. 4. Concentrações de amônia ruminal e uréia plasmática e excreções de uréia e creatinina. Revista Brasileira de Zootecnia, v.26, n.6, p.1270-1278, 1997.
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