10 – 14 de nov. de 2025
UFLA
Fuso horário America/Sao_Paulo

Explorando a microbiota e o perfil químico de cafés Robustas Amazônicos fermentados pelo método de anaerobiose autoinduzida (SIAF)

12 de nov. de 2025 13:30
1h 30m
Centro de Eventos (UFLA)

Centro de Eventos

UFLA

Avenida Norte - Lavrinhas, Lavras - MG, 37200-900
Resumo Expandido Ciência dos Alimentos 3º Dia

Descrição

Abstract. This study evaluated the fermentation of Amazonian Robusta coffees (clone 025, clone 08 and apoatã) using the self-induced anaerobiosis fermentation (SIAF) method. Metataxonomic analyses (NGS) and volatile compound profiling (GC/MS) were conducted. The metataxonomic analyses identified the predominance of Kazachstania humilis in clones 025 and 08, while apoatã showed higher abundance of Candida sake and Fusarium solani. A total of 83 volatile compounds were detected, with esters being the predominant class at the end of fermentation. Clone 025 presented the highest total concentration (605 mg/kg). The results demonstrate the influence of genetics and native microbiota on the biochemical modulation of coffees, reinforcing the potential of SIAF for producing differentiated beverages.
Keywords: Amazonian Robustas, Microbial profile, Volatile compounds.

Resumo. Este estudo avaliou a fermentação de cafés Robustas Amazônicos (clone 025, clone 08 e apoatã) pelo método de anaerobiose autoinduzida (SIAF). Foram conduzidas análises metataxonômicas (NGS) e perfil de compostos voláteis (GC/MS). As análises metataxonômicas identificaram a predominância de Kazachstania humilis nos clones 025 e 08, enquanto apoatã apresentou maior abundância de Candida sake e Fusarium solani. Foram detectados 83 compostos voláteis, sendo os ésteres a classe predominante ao final da fermentação. O clone 025 apresentou maior concentração total (605 mg/kg). Os resultados demonstram a influência da genética e da microbiota autóctone na modulação bioquímica dos cafés, reforçando o potencial do SIAF na obtenção de bebidas diferenciadas.
Palavras-chave: Robustas Amazônicos, Perfil microbiano, Compostos voláteis.
1. Introdução
O estado de Rondônia, na Amazônia Ocidental, é uma das principais regiões produtoras de Coffea canephora no Brasil, onde se destacam as variedades apoatã, clone 025 e clone 08, pertencentes à Indicação Geográfica (IG) “Matas de Rondônia”. Esses cafés se diferem em produtividade, porte e composição química, apresentando características sensoriais únicas, como notas frutadas, herbáceas, achocolatadas e amargor característico [Espindula et al., 2022]. O Robusta Amazônico é o primeiro café da espécie Coffea canephora com IG registrado no mundo [Brasil, 2021].
O avanço do mercado de cafés especiais está diretamente relacionado à valorização crescente de grãos com qualidade superior, alcançada por meio de práticas rigorosas de cultivo e processamento. Essas técnicas geram cafés com menos defeitos, aprimoram o perfil sensorial da bebida e potencializam a diversidade de aromas e sabores. Entre as etapas de processamento, a fermentação é considerada a mais importante para a qualidade final [Baqueta et al., 2024; Cassimiro et al., 2023; Schwan e Fleet, 2014].
A fermentação de café é realizada de forma espontânea ou conduzida com adição de culturas iniciadoras, é reconhecida por influenciar a formação de ácidos orgânicos, álcoois superiores e ésteres, essenciais para o aroma e o sabor da bebida. O método de fermentação SIAF (self-induced anaerobiosis fermentation) tem se mostrado promissor para a modulação microbiana e química de grãos de café, favorecendo a formação de compostos voláteis e não voláteis determinantes para a qualidade sensorial [Cassimiro et al., 2023].
Nesse contexto, técnicas analíticas avançadas, como o sequenciamento de nova geração (NGS) e a cromatografia gasosa acoplada à espectrometria de massas (CG/EM), têm papel fundamental na avaliação da fermentação do café. O NGS possibilita a identificação detalhada das comunidades microbianas e sua dinâmica ao longo do processo, prevendo seu potencial funcional, enquanto o CG/EM permite identificar os compostos voláteis responsáveis pelo aroma e sabor da bebida. A integração dessas abordagens fornece uma visão abrangente das interações entre microbiota e metabolismo durante a fermentação [Verce et al., 2021].
Apesar da crescente relevância dos Robustas Amazônicos, ainda há poucos estudos sobre suas comunidades microbianas e composição volátil durante a fermentação. Assim, o presente estudo teve como objetivo avaliar a dinâmica microbiana e as alterações nos perfis voláteis nas diferentes variedades de C. canephora (clone 025, clone 08 e apoatã) fermentadas sob SIAF por 21 dias.
2. Materiais e Métodos
Frutos cereja dos cafés clone 025, clone 08 e apoatã foram colhidos manualmente e fermentados em biorreatores de polietileno de alta densidade (20 L) por 21 dias, na Embrapa Café em Porto Velho, Rondônia. Amostras foram coletadas em 0 e 21 dias e congeladas a -20 °C para posteriores análises.
A diversidade microbiana foi analisada por Sequenciamento de Nova Geração (NGS) utilizando as regiões ITS1/ITS2 do gene ITS para fungos, e as bibliotecas preparadas foram sequenciadas na plataforma Illumina MiSeq (600 ciclos, paired-end). O processamento dos dados foi realizado no pipeline Sentinel, incluindo avaliação de qualidade (FastQC), trimagem (Phred <20), união das leituras (PANDAseq) e descarte de clusters pouco abundantes (<5). A identificação taxonômica foi conduzida por Blastn, considerando similaridade ≥97%, com critérios de bit-score, e-value e representatividade taxonômica. As análises de diversidade foram baseadas em bancos de dados específicos de ITS [White et al., 1990].
O perfil de compostos voláteis foi analisado por Cromatografia Gasosa acoplada à Espectrometria de Massas (CG/EM), utilizando a microextração em fase sólida no headspace (HS-SPME), utilizando coluna capilar de sílica Carbowax 20M, conforme parâmetros descritos por Martinez et al. (2024). A identificação dos picos foi feita por comparação dos espectros de massa com o banco de dados NIST11.
3. Resultados e discussão
3.1 Comunidades microbianas
Foram identificados 75 gêneros e 146 espécies fúngicas com abundância ≥ 0,01 %. O gênero Kazachstania predominou ao final da fermentação nos clones 025 e 08. Em contraste, Fusarium apresentou maior abundância no início da fermentação do clone 08 e ao final da fermentação do apoatã (21 dias). O gênero Yarrowia foi detectado exclusivamente no apoatã, no início da fermentação (0 dias).
Entre as espécies, Kazachstania humilis foi a mais abundante ao final da fermentação nos clones 025 e 08, sendo registrada pela primeira vez em Coffea canephora. Essa espécie já é conhecida por sua contribuição positiva na fermentação de C. arabica, especialmente pela produção de compostos voláteis associados a notas frutadas e florais [Cruz-O’Byrne et al., 2023; Schwan et al., 2023], o que sugere um papel potencial na melhoria do perfil sensorial dos Robustas Amazônicos.
Já o apoatã apresentou maior abundância de Candida sake e Fusarium solani ao término do processo fermentativo. Esses microrganismos têm sido relacionados à menor produção de metabólitos desejáveis. Fusarium é conhecido pela geração de toxinas que comprometem a qualidade e segurança da bebida [Schwan e Fleet, 2014].
3.2 Compostos voláteis
Foram identificados 83 compostos voláteis presentes no início e no final de fermentação, distribuídos em álcoois, ésteres, aldeídos, ácidos, fenóis, ácidos graxos e outros grupos químicos. No início da fermentação, a classe mais abundante foi dos álcoois, como 2-nonanol, álcool feniletílico e álcool benzílico, além de ésteres benzoato de 2-hidroxietila e aldeídos, incluindo 2-nonenal e benzaldeído (Figura 2).
No final da fermentação, houve aumento expressivo de compostos voláteis, em especial os ésteres, que se tornaram a classe química predominante. O clone 025 apresentou a maior concentração total de compostos voláteis ao final da fermentação (605 mg/kg), entre eles, os ésteres mais abundantes foram o salicilato de metila (59 mg/kg) e succinato de dietila (55 mg/kg), responsáveis por notas frutadas e florais [Elhalis et al., 2020].
Entre os álcoois, 2-nonanol e álcool feniletílico foram os mais abundantes em todas as variedades e podem contribuir com nuances de mel, frutas cítricas e florais [Elhalis et al., 2020]. O benzaldeído foi o aldeído mais abundante em todas as variedades. O clone 08 exibiu teores relativamente mais altos de fenóis (43 mg/kg) associados a descritores defumados e amadeirados [Flament, 2001]. Esses resultados demonstram que o perfil volátil final depende da variedade do café e da atividade microbiana durante a fermentação.
4. Conclusão
O estudo mostrou que diferentes variedades de cafés robustas amazônicos (clone 025, clone 08 e apoatã) impactam nos perfis microbianos e voláteis. O clone 025 apresentou maior potencial de qualidade sensorial, associado à predominância de K. humilis e maior concentração de compostos voláteis associados à percepção de notas frutadas, doces e florais. O clone 08 também apresentou maior abundância de K. humilis, porém foi caracterizado por teores mais elevados de fenóis, o que pode conferir notas defumadas e amadeiradas. Já o apoatã apresentou predominância de F. solani, microrganismo indesejável que pode comprometer a qualidade da bebida. Os resultados destacam o papel da microbiota autóctone e da variedade na definição da qualidade final da bebida, reforçando o SIAF como ferramenta estratégica para valorização dos Robustas Amazônicos.

Agradecimentos
Os autores agradecem o apoio financeiro das agências CAPES, CNPq, FAPEMIG e LaMFe.

Referencias
Baqueta, M. R., Postigo, M. P., Alves, E. A., de Moraes Neto, V. F., Valderrama, P., Pallone, J. A. L., & Diniz, P. H. G. D. (2024). Authentication of indigenous Brazilian specialty canephora coffees using smartphone image analysis. Food Research International, 196, 115133.
Brasil, Cafés brasileiros com indicação geográfica, 2021. https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/sustentabilidade/indicacaogeografica/arquivospublicacoes-ig/brazilian-coffees-with-geographical-indication
Cassimiro, D. M. de J., Batista, N. N., Fonseca, H. C., Oliveira Naves, J. A., Coelho, J. M., Bernardes, P. C., Dias, D. R., & Schwan, R. F. (2023). Wet fermentation of Coffea canephora by lactic acid bacteria and yeasts using the self-induced anaerobic fermentation (SIAF) method enhances the coffee quality. Food Microbiology, 110, 104161. https://doi.org/10.1016/j.fm.2022.104161
Cruz-O’Byrne, R., Gamez-Guzman, A., Piraneque-Gambasica, N., & Aguirre-Forero, S. (2023). Genomic sequencing in Colombian coffee fermentation reveals new records of yeast species. Food Bioscience, 52, 102415. https://doi.org/10.1016/j.fbio.2023.102415
Elhalis, H., Cox, J., Frank, D., & Zhao, J. (2020). The crucial role of yeasts in the wet fermentation of coffee beans and quality. International Journal of Food Microbiology, 333, 108796. https://doi.org/10.1016/j.ijfoodmicro.2020.108796
Espindula, M. C., Dalazen, J. R., Rocha, R. B., Teixeira, A. L., Diocleciano, J. M., Dias, J. R. M., Schmidt, R., de Lima, P.P., Lima, G.M., & Gama, W. (2022). Robustas Amazônicos: os cafeeiros cultivados em Rondônia. Retrieved from https://www.alice.cnptia.embrapa.br/alice/handle/doc/1152388?mode=full. Accessed January 30, 2022.
Flament, I. (2001). Coffee flavor chemistry. John Wiley & Sons.
Martinez, S. J., Batista, N. N., Bressani, A. P. P., Leite, S., Oliveira Naves, J. A., Dias, D. R., & Schwan, R. F. (2024). Volatiles and sensory mapping of SIAF fermentations with selected coffee yeasts from different Brazilian regions. Food Bioscience, 62, 105551. https://doi.org/10.1016/j.fbio.2024.105551
Schwan, R. F., & Fleet, G. H. (2014). Cocoa and coffee fermentations. CRC Press.
Schwan, R. F., Bressani, A. P. P., Martinez, S. J., Batista, N. N., & Dias, D. R. (2023). The essential role of spontaneous and starter yeasts in cocoa and coffee fermentation. FEMS Yeast Research, 23. https://doi.org/10.1093/femsyr/foad019
Verce, M., Schoonejans, J., Hernandez Aguirre, C., Molina-Bravo, R., De Vuyst, L., & Weckx, S. (2021). A combined metagenomics and metatranscriptomics approach to unravel Costa Rican cocoa box fermentation processes reveals yet unreported microbial species and functionalities. Frontiers in microbiology, 12, 641185.
White, T. J., Bruns, T., Lee, S., & Taylor, J. (1990). Amplification and direct sequencing of fungal ribosomal RNA genes for phylogenetics. In PCR Protocols, 315–322. https://doi.org/10.1016/B978-0-12-372180-8.50042-1

Selecione a modalidade do seu trabalho Resumo Expandido

Autor

Sandy Rodrigues Dias (UFLA)

Co-autores

Ana Paula Pereira Bressani (UFLA) Nádia Nara Batista (UFLA) Silvia Juliana Martinez (UFLA) Disney Ribeiro Dias (UFLA) Rosane Freitas Schwan (UFLA)

Materiais de apresentação

Ainda não há materiais